domingo, 28 de abril de 2019

29/04 VEM DEBATER COM A GENTE!

Sala de aula é realmente um espaço lindo! Como são valiosos os momentos em que as pessoas "se dão conta" das coisas e levam aquilo consigo, reverberando por muito tempo aquela mensagem que precisa ser mais do que ecoada! Lembrei das escritas sobre preconceito de tempos atrás e de como podemos trabalhar e trazer à luz da reflexão construtiva esta abordagem. Nestas postagens, trabalhava a questão racial e hoje, neste post conto uma daquelas "tomadas de consciência" que aquecem nosso coração professor.
Debatíamos em sala de aula um video da neurocientista Suzana Herculano, que abordava as transformações no cérebro adolescente. Neste debate, veio a questão da preferencia sexual e da opção sexual. Os alunos contribuíram muito na dinâmica da aula e a questão da repressão das opções sexuais veio a tona, pois as pessoas não se sentem "permitidas" por suas questões familiares, religiosas, sociais...enfim, reprimem suas preferências e opções em nome do que a sociedade (ainda, infelizmente) julga como correto. Notei que traziam muitos casos de relato em que a homofobia foi presente na vida deles, e posicionaram-se sobre o preconceito sexual, de gênero, racial, religioso, social, racial.
No final da aula, perceberam como a aula mudou de rumo sem aquele tom "ameaçador" de doutrinação ou lavagem cerebral que muitos temem e imaginam que estes assuntos "polêmicos" possam configurar nas salas de aula. Foi um debate franco e aberto onde todos puderam ser escutados. 
Até que alguém disse "quando a gente fala desses assuntos tabus, quem sente estes preconceitos pode ser escutado. Pode se sentir parte, e dizer que a existência dele ou do jeito que ele é não é um jeito errado, nem proibido, nem ruim...é importante isso, né?"
E a professora, calada, sorri e sente que o rumo da aula, que mudou totalmente, era o rumo que precisava ser tomado. E que cada vez mais venham estas construções despretensiosas e naturais, plenas de significado para alunos e professores.

segunda-feira, 22 de abril de 2019

22/04 NÃO TENHA MEDO DA ARTE

Arte é toda manifestação individual ou coletiva que expresse sentimentos e emoções, registre ou demonstre um momento histórico ou proteste contra este. Arte não é bonita. Arte não é feia. Tampouco é útil ou inútil. Simplesmente é arte. E só de ser, já é arte. Pode ser expressada através de diversas formas e materiais, desde os já conhecidos materiais de obras de arte até coisas inusitadas, ou até mesmo efêmeras. Precisa ser sentida, não somente vista. E este sentimento é dentro dos humanos, não através dos sentidos, necessariamente. Usamos os sentidos para informar nosso interior do que é a arte que estamos contemplando, mas a sentimos dentro de nós, em um processo muito íntimo e individual. Cada um sente do seu jeito.
E neste cenário político e social atual do Brasil, onde pensar parece uma contravenção, retorno ao dia da postagem mais triste do ano passado. Naquele dia, a arte da vida se manifestava em muitos olhares, em muitos gritos, em muitos pensamentos. Nem todos expuseram sua arte nas ruas, nem todos cantaram a canção que dizia o que sentiam, nem todos esculpiram o que lhes vinha do coração. Assim, nesta luta interna contra as forcas de uma sociedade cega e atendendo ao clamor popular, a injustiça foi feita. Com arte ou sem arte, sentimos: ou ódio ou alegria.
Em franca reflexão do papel da arte em nossas vidas, reitero o quanto esse dia foi triste, bem como seu registro fotográfico artístico. O que não imaginávamos era como as coisas se desenrolariam dali para a frente, ou se enrolariam mais ainda. E viveríamos tempos retrocessos, onde até a arte, ou talvez principalmente a arte seja questionada. 
Eu sigo com minhas impressões iniciais, onde não coloco a arte como útil ou necessária, mas uma excelente oportunidade em nossas vidas de nos conhecermos. Procuramos utilidade em tudo, queremos saber para que servem. Pois bem, a arte serve para nos transformar. Mesmo as obras clássicas nos transformam, imagine o que nos provocam as obras contemporâneas que nos colocam, muitas vezes, como protagonistas da própria arte. Não esperamos encontrar a arte somente em museus ou galerias, teatros ou igrejas. Que sejamos capazes de ver a arte em diversos espaços onde ela se manifesta, com cada vez mais novas possibilidades de materiais de exploração para exprimir os sentimentos dos artistas.
A humanidade ainda tem muito a caminhar em torno de seu próprio conhecimento como espécie e todas as nuances que nela encontramos. Para isso a arte “serve”, para isso ela existe. Nos traz sentimentos, nos indaga, nos mostra, nos desacomoda, nos perturba. Mas também, nos ensina a pensar em nós mesmos, no que sentimos e no que temos feito de arte em nossas vidas.

domingo, 14 de abril de 2019

15/04 FAZENDO ARTE


"Crianças arteiras" são aquelas que se diz "fazem muitas artes", no sentido de peraltices, bagunças. Aquelas que quando fazem silêncio é porque estão "fazendo arte". 
Assim são as crianças daqui de casa, provavelmente são também tantas outras que conhecemos. Fazem coisas "proibidas", descobrem coisas em armários e experimentam sensações que não seriam possíveis diante de nossos olhos cuidadores. Se aventuram em situações que podem colocar em risco sua integridade física, nos trazem joelhos e cotovelos ralados, cabeças com galos, cortes nos dedos. Nos mostram novos cortes de cabelo, unhas finamente decoradas e uma remodelação das próprias roupas. No mais puro sentido, estão "fazendo arte". E neste processo estão crescendo, se desenvolvendo fisicamente e intelectualmente. Experimentam e expressam, sentem e fazem sentir.  
Na arte de seu desenvolvimento, manifestam através de suas habilidades os seus sentimentos e suas emoções. Desenham, pintam, modelam, dançam, cantam, encenam, imitam. Simplesmente surpreendem, simplesmente. Fazem de sua fase da vida, uma obra de arte que precisa ser admirada, protegida e respeitada como legítima e importante. 
Pensar nas crianças como artistas natos é dar-lhes o aval para que criem e deixem toda sua criatividade e expressividade explicar o mundo que estão descobrindo. Que possam, sem padronizações, nos mostrar as possibilidades de entender o mundo.
No sentido contrário, na Educação formal, muitas vezes, encontramos um outro caminho sendo trilhado. Não por falta de vontade ou desejo de uniformizar, as vezes até mesmo por falta de profissionais habilitados para a tarefa. No currículo, Artes é presente quando é viável. Quando não ocorre assim, é um momento de propor atividades diferentes das propostas pelas outras áreas do conhecimento. 
Esta perspectiva, confesso, penso agora com as provocações da disciplina de Artes Visuais e Educação. E repensando, como as propostas são feitas para meus filhos, para meus alunos, para nós mesmas como alunas neste momento ainda. E pensando em como nosso desenvolvimento poderia ter oferecido mais momentos de “arte”. Sabiamente, nossa professora de Artes, Susana Rangel, nos alerta:
Em um contexto mais específico da educação formal, seja da Educação Infantil ao ensino universitário, na maioria das vezes, o ensino de arte e também outras áreas do conhecimento, ao invés de promover ações pedagógicas que levem crianças e adultos ao universo da criação e estruturação da linguagem visual, acaba tolhendo os modos singulares dos alunos entenderem e expressarem suas leituras e relações com o mundo. 

Não se trata, portanto de uma questão ligada somente ao ensino de Artes. Neste momento o enfoque é este, mas a longo prazo e, talvez em tempo de salvarmos nós mesmo de um colapso criativo, talvez essa reflexão seja a chance de mudarmos muitas perspectivas.
Fui por diversos pensamentos neste texto, eu sei. Talvez estivesse pensando artisticamente, ou pensando sobre a liberdade das crianças poderem fazer suas artes. E quando pensarmos nas crianças arteiras, que possamos também pensar nas suas artes. Pensarmos nas crianças que são, na verdade, artistas. E, principalmente, não esqueçamos que podemos também ser adultos arteiros artistas.

DA CUNHA, Susana Rangel Vieira. Como vai a Arte na Educação Infantil? Educação Presente. CEAP, Salvador: v. 56, p. 4-12, 2007.



domingo, 7 de abril de 2019

08/04 AÇÃO PEDAGÓGICA INVISÍVEL

Na escola, seria importante em nossa prática como educadoras, experimentarmos diferentes posições. Sair um pouco da sala de aula e atuar em outros espaços educacionais para compreender a engrenagem que sustenta o processo todo. Muitas vezes estamos em nossa posição de mais conforto, onde atuamos em "nosso chão" e não percebemos o quanto os outros espaços também estão envolvidos.  
No final de 2018 fui convidada pela direção da escola em que trabalho para atuar na Coordenação de Turno. Nunca saí da sala de aula. Sempre estive lá, junto aos alunos. De imediato não dei o meu aceite, pois tenho apego a sala de aula e ao convívio direto com os estudantes. Com um pouco de reflexão o convite foi aceito e o desafio também.
Na coordenação de turno a vivência é outra. A rotina é outra e os alunos são atendidos sob outros aspectos. Alguns alunos tornam-se nossos companheiros frequentes, pela indisciplina ou atrasos constantes. Outros, por apresentarem sempre alguma queixa física. Também lá se conhece mais de perto as famílias. 
Os colegas ausentes por qualquer motivo são repostos por outros colegas através de nosso famoso "bilhetinho" que indica quais turmas têm com ausência de professor. Quando ninguém está disponível, atuamos em sala de aula também. Sem nosso próprio material, sem planejamento específico para a turma, sem conhecer a turma e suas peculiaridades.  
O recreio também é nosso espaço. Nossa presença abranda ânimos mais exaltados e faz companhia para os mais solitários. Os atendimentos de urgência são também resolvidos mais rapidamente assim.  
Mas o que não esperava era ficar tão envolvida pedagogicamente com os alunos. No trato mais próximo, muitas vezes de simples escuta, percebemos que nossa ação pedagógica pode mudar um comportamento que, naquele dia, não condizia com o esperado para a sala de aula. Onde a pedagogia atua na escola? Somente na sala de aula? Somente no ensino e aprendizagem? Nas dificuldades de sala de aula e nas estratégias de planejamento para as diferentes abordagens?
Sim, em tudo isso.
Mas, antes de aceitar o convite consultei uma colega que já atuou no espaço que ocupo hoje. Aposentada agora, falou-me com carinho da coordenação. Com tanto carinho que a conversa foi decisiva para meu aceite positivo. Em sua fala me disse: "a coordenação é uma caixinha de surpresas. Vais ter que resolver muitos problemas, abrandar muitas brigas, ter muita paciência. Mas, acima de tudo, vais escutar muito. Porque, às vezes, só precisam de alguém que os escute, sem julgamentos". 
Ali pude entender o tamanho do desafio. O tamanho da responsabilidade.
Alguns dias deste ano já foram bem difíceis. A dinâmica é muito ativa: praticamente passo em deslocamento dentro da escola o tempo todo. E, neste pouco tempo, já exercitei bastante minha escuta e acolhida, sob um olhar pedagógico. A Pedagogia está na escola toda!   

segunda-feira, 1 de abril de 2019

01/04 AS CORES DO MUNDO

Rosa para meninas, azul para meninos. A coisa ficou preta. Verde de fome. Azul de frio. Branco de medo. Mundo Cor-de Rosa. Entrou no vermelho. Ficou tudo azul.
Comumente as cores podem ser utilizadas em nosso cotidiano para referir sentimentos ou designar especificidades de alguma situação. Algumas vezes essas expressões são carregadas de preconceitos e acabam reforçando situações que buscamos, em um mundo ideal, combater.
A questão que hoje destaco já discuti em outros momentos. Já trabalhamos aqui neste blog com a questão de etnias, gênero, busca por igualdade de oportunidades e direitos e seguimos observando e pensando em meios de seguir no mundo com estes preconceitos, combatendo-os e ensinando para que estes ciclos não se repitam. 
Em uma época em que o conservadorismo sente-se autorizado a multiplicar velhas crenças, velhas ideias e multiplicar o preconceito que já existe enraizado na nossa cultura, lutamos com passos de formiguinha, mas sempre lutando. Não nos cansamos de pensar diferente e elaborar esse pensamento para fora de nossas caixas, extravasando nosso pensar e alcançando o outro, a outra mente, a  outra pessoa. 
Trabalhar com Educação, trabalhar com pessoas, trabalhar com mentes em desenvolvimento é tarefa das mais exaustivas. Não somente pela carga de trabalho que excede, muitas vezes, nosso horário dentro da escola (sim, trabalhamos muito em nossas outras horas diárias). Mas, principalmente pela tarefa que é inerente ao nosso fazer: interagir, questionar, desafiar.
Nesta postagem a escrita foi motivada por um aluno que me apresentou uma nova cor: "a cor de porco". Cor de porco é aquela cor que era conhecida como "cor de pele". Nunca mais vou esquecer da cor de porco. Alguns porcos poderão reivindicar a denominação, pois não se sentem representados pela cor que os denomina. Outros, até gostarão ao saberem que existe uma cor especifica para lhes significar. Antes cor de pele, agora cor de porco. Para mim e para o aluno será assim. Porque, segundo ele, cor de pele "não tem na caixa de lápis". Cada dia seguimos desconstruindo para nos fortalecermos.