"Crianças
arteiras" são aquelas que se diz "fazem muitas artes", no
sentido de peraltices, bagunças. Aquelas que quando fazem silêncio é porque
estão "fazendo arte".
Assim
são as crianças daqui de casa, provavelmente são também tantas outras que conhecemos.
Fazem coisas "proibidas", descobrem coisas em armários e experimentam
sensações que não seriam possíveis diante de nossos olhos cuidadores. Se
aventuram em situações que podem colocar em risco sua integridade física, nos
trazem joelhos e cotovelos ralados, cabeças com galos, cortes nos dedos. Nos
mostram novos cortes de cabelo, unhas finamente decoradas e uma remodelação das
próprias roupas. No mais puro sentido, estão "fazendo arte". E neste
processo estão crescendo, se desenvolvendo fisicamente e intelectualmente.
Experimentam e expressam, sentem e fazem sentir.
Na
arte de seu desenvolvimento, manifestam através de suas habilidades os seus
sentimentos e suas emoções. Desenham, pintam, modelam, dançam, cantam, encenam,
imitam. Simplesmente surpreendem, simplesmente. Fazem de sua fase da vida, uma
obra de arte que precisa ser admirada, protegida e respeitada como legítima e
importante.
Pensar
nas crianças como artistas natos é dar-lhes o aval para que criem e deixem toda
sua criatividade e expressividade explicar o mundo que estão descobrindo. Que
possam, sem padronizações, nos mostrar as
possibilidades de entender o mundo.
No
sentido contrário, na Educação formal, muitas vezes, encontramos um outro
caminho sendo trilhado. Não por falta de vontade ou desejo de uniformizar, as
vezes até mesmo por falta de profissionais habilitados para a tarefa. No
currículo, Artes é presente quando é viável. Quando não ocorre assim, é um momento
de propor atividades diferentes das propostas pelas outras áreas do
conhecimento.
Esta perspectiva, confesso,
penso agora com as provocações da disciplina de Artes Visuais e Educação. E
repensando, como as propostas são feitas para meus filhos, para meus alunos,
para nós mesmas como alunas neste momento ainda. E pensando em como nosso desenvolvimento
poderia ter oferecido mais momentos de “arte”. Sabiamente, nossa professora de
Artes, Susana Rangel, nos alerta:
Em
um contexto mais específico da educação formal, seja da Educação Infantil ao
ensino universitário, na maioria das vezes, o ensino de arte e também
outras áreas do conhecimento, ao invés de promover ações pedagógicas que
levem crianças e adultos ao universo da criação e estruturação da linguagem
visual, acaba tolhendo os modos singulares dos alunos entenderem e expressarem
suas leituras
e relações com o mundo.
Não se trata, portanto de uma questão ligada somente ao ensino de
Artes. Neste momento o enfoque é este, mas a longo prazo e, talvez em tempo de
salvarmos nós mesmo de um colapso criativo, talvez essa reflexão seja a chance
de mudarmos muitas perspectivas.
Fui por diversos pensamentos neste texto, eu sei. Talvez estivesse
pensando artisticamente, ou pensando sobre a liberdade das crianças poderem
fazer suas artes. E quando pensarmos nas crianças arteiras, que possamos também
pensar nas suas artes. Pensarmos nas crianças que são, na verdade, artistas. E,
principalmente, não esqueçamos que podemos também ser adultos arteiros
artistas.
DA CUNHA, Susana Rangel Vieira. Como vai a Arte na Educação
Infantil? Educação Presente. CEAP, Salvador: v. 56, p. 4-12, 2007.
Nenhum comentário:
Postar um comentário