quarta-feira, 28 de setembro de 2016

Há um modo de voar dentro da gaiola?

Na leitura da semana "Gaiolas ou asas?", Rubem Alves nos surpreende, como sempre, com suas ideias inesperadas sobre a vida, sobre a educação e os sentimentos que todos temos e não sabemos descrevrer tão bem quanto ele. No texto, seu aforismo Há escolas que são gaiolas. Há escolas que são asas” nasceu de um momento com professoras de ensino médio de escolas de periferia. Nesta conversa angustiante para ele, percebeu que a docência para estes mestres tornara-se um martírio. Sofreu com isso. Neste sentimento, o dueto “gaiolas/ asas” lhe pareceu muito significante para retratar uma situação comum na educação: o desgaste do amor pela profissão, decornte das implicações diárias que vivemos. Nossa ideologia “lá de antigamente” adormece, às vezes desperta, e temos saltos de alegria em atuar na educação. Mas, muitas vezes, sentimos que estamos mesmo em escolas gaiolas, tanto gaiolas para os alunos como para os professores. Por vezes as gaiolas se tornam jaulas, como também nos descreveu o autor, cercados por leões ferozes (ou vorazes de alguma coisa que não compreendemos, além de fome?)
Talvez eu pareça contraditória ao expor minha opinião sobre o que penso sobre Rubem Alves, e consequentemente, se concordo ou discordo de seu entendimento de educação.Maravilho-me a cada novo aprendizado com ele. Dos poucos contatos que tive, em cada palavra sua sente-se a verdade do que acredita e defende: a possibilidade de uma Educação livre. 
Quando penso nas escolas gaiolas, penso nas escolas em formato tradicional, que seguem os conteúdos de cada ano escolar e cumprem seu papel educacional de maneira a ofertar aos alunos o conhecimento. Quando penso em escolas asas, penso em escolas que ofereçam a possibilidade de aprender os mesmos conteúdos de uma outra forma. Mas a “outra forma” é que não me convence. Ou não a conheço. Ou a idealizo demais, por isso me amedronto em defender.
Corremos, em nossos cotidianos, atrás de escolas que tenham bons índices de aprovação, que tenham índices altos de aproveitamento, que tenham a desejada “educação de excelência”. Ser uma escola gaiola, será, não é também dar asas?
Há pouco tempo falei para meus alunos em sala que o melhor presente que poderiam me dar seria, depois de alguns anos, retornarem na escola e me encontrarem lá ainda trabalhando. Nesta visita, que me mostrassem como puderam alçar os próprios voos, distantes de uma realidade dificultosa que vivem. Que entendessem que meu desejo não era vê-los “passar de ano”, era vê-los passar pela vida construindo suas vidas. Explico a eles também que aprender e crescer é como construir uma casa: aos poucos, peça por peça. Tijolo por tijolo...se deixar de colocar tijolos a construção fica frágil. E às vezes, precisamos demolir uma parte e reconstruir tudo, às custas de muito esforço. Que não adianta colocar o telhado na casa sem paredes sólidas. Os ventos podem ser fortes e levar todo o telhado, além de derrubar as paredes. Assim me observam falar sobre a importância de estudar, de aprender, de ter curiosidade e espírito de busca. De ter planos de vida, de ter objetivos e sonhos. 
Desde o básico (frequência escolar) até o desejado (autonomia), o que buscamos na escola é o crescimento dos alunos. Mas depois de “Gaiolas ou Asas?” me questiono se buscamos, na verdade, o voo dos alunos.


REFERÊNCIA
ALVES, Rubem. Gaiolas ou asas?

In: ALVES, Rubem. Por uma educação romântica. Campinas: Papirus, 2002, p. 29-32.

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