sexta-feira, 27 de maio de 2016

Não merecemos!

Ontem escrevi sobre um vídeo que relatava sobre o espanto de crianças ao perceberem que uma mulher era bombeira, pilota e cirurgiã...tendem a imaginar que estas profissões, assim como tantas outras, preferencialmente serão ocupadas por homens. 
Hoje, ao conectar-me a primeira notícia que leio é sobre um vídeo (também) que mostra o estupro coletivo a uma menor no RJ. Hoje o espanto foi meu, todo meu. O estupro, por si, já é um fato horroroso. Mas por trinta homens??? Que selvageria é essa? Que falta de "tudo" que estamos vivendo: de amor ao próximo, de coerência, de empatia, de humanidade, de sabedoria, de consciência, de tudo, enfim!

 Passei o dia, aos poucos, lendo opiniões sobre o ocorrido. As manifestações pró empoderamento feminino e feminismo são inúmeras. E são importantes, sim! Devemos e podemos conscientizar as meninas, as mulheres de que não são objetos, não são "coisas" que somente enfeitam a sociedade. Que têm voz, vontade, desejo e direito de expor sua existência sem medo de ser subjugada ou desmerecida. Por muito tempo fomos assim. Por muito tempo. Não somos mais?
Sim, conquistamos muitos espaços que sequer sonhávamos, somos capazes de feitos que todos duvidavam, temos capacidade de realizar e não vamos retroceder jamais! Mas o preço que pagamos por tudo isso tem sido bem caro. 
Na questão sexual, principalmente, somos vistas como objetos, como desmerecedoras de prazer ou incapazes de tal sentimento. Tampouco temos desejo. Somos vistas, ainda, como pedaços de carne. Nossos corpos expostos são interpretados como "convites" ao ato sexual. Nosso comportamento pode ser interpretado como promíscuo e se "provocarmos" um homem a "culpa" do estupro pode ser nossa! Enfim, não há evolução neste âmbito, nem justiça apropriada para estes crimes. A banalização da violência contra mulheres afronta nossa luta tanto quanto um estupro! Mulheres são assassinadas por parceiros ou homens rejeitados. Meninas são assediadas e estupradas por homens, geralmente, da própria família. 
Mas no que concerne, afinal este asunto com o objetivo deste blog? Em tudo! 
No nosso cotidiano escolar, lidamos com personalidades em desenvolvimento, o amadurecimento de habilidades humanas pode estar nas nossas mãos. Temos ferramentas para tal. Discutir este tema (que é sim, tabu nas escolas) é necessário, além de moralmente obrigatório. Necessitamos, muito!
No entanto, hoje pensando em tudo isso, refleti sobre minhas atitudes. Vou empoderar minha filha de todas as maneiras possíveis. Quero que se sinta capaz de tudo que um homem pode alcançar. Ser uma menina/ mulher não será obstáculos para que conquiste o que quiser. Mas terei de ensiná-la a sobreviver nesta selva, ainda. Digo "ainda" porque não vejo evolução concreta neste campo, embora deseje e busque por ela.
Fui ensinada (e ensinarei) que os trajes devem preservar nosso corpo (não acredito que estou escrevendo isso!). Recomendarei sempre que não ande desacompanhada, que tenha segurança de quem a acompanha e que conheça as pessoas que a cercam. Que se preserve recatadamente (novamente não acredito que estou escrevendo isso!), pois uma mulher que expõe seus desejos em atitudes pode ser interpretada como cedente de sexo fácil ou promíscua.
Recomendo minhas alunas na periferia (e também o faria se fossem de uma zona nobre da cidade) para que voltem com colegas para casa no final da tarde. Que rumem diretamente para seus lares. Que mantenham seus corpos "decentemente" cobertos para a vinda à escola e, principalmente, no trajeto. Que fiquem atentas aos homens que frequentam suas casas, sejam familiares ou não. E que saibam que o corpo é delas, portanto, ninguém tem o direito de tocá-lo sem consentimento. Que devem relatar (e isso inclui a escola) qualquer abuso, qualquer violação de sua intimidade.
Nenhuma destas atitudes é garantia de que um estupro será evitado. O "instinto" masculino não necessita de premissas para desencadear um ataque. Em um mundo onde mulheres podem ser estupradas apenas por serem mulheres, não há necessidade de justificativas. Mas alguma forma de proteção precisamos ter. Estamos engatinhando há muito tempo nesta área, e não temos evolução. Ainda somos vistas como culpadas (e pela última vez: não acredito que escrevo isso).
Fui contraditória neste texto, sei. Defendo o empoderamento feminino e ensino tudo isso às meninas de minha convivência? Mas, infelizmente, ainda vejo a fragilidade das mulheres nesta área. E pior que sua fragilidade, é a fragilidade da justiça perante esses crimes. Enquanto convivermos com estas atrocidades, recomendarei sim! Tentarei evitar. Estarei atenta aos sinais de abuso (e temos tantos casos!). Lutarei por justiça, dignidade e igualdade de direitos das mulheres. 
Estou em conflito interno, confesso. Como mudar essa realidade se me submeto a essa posição de "carente de proteção" como mulher?
Ensinar as meninas que têm total liberdade de suas escolhas, que não precisam de um homem para ter uma vida plena, que a atividade sexual é uma escolha delas e que têm o direito de procurar o próprio prazer, que podem (devem) escolher seus perceiros, que a proteção sexual (preservativo) é importante e que devem exigir, oferecer acesso a informação sobre educação sexual são maneiras de trabalhar conceitos de empoderamento feminino na área sexual. Claro que também buscamos a igualdade no mercado de trabalho, nos salários, nos papéis da sociedade. Buscamos também desenvolver o amor próprio através da aceitação do seu corpo, de suas características e que não precisam buscar os padrões de beleza para se sentirem bonitas e de bem consigo. Querermos as mulheres com liberdade, acima de tudo. Mais uma vez, fui contraditória
Não me espantarei daqui um tempo ao ver as mulheres plenas de seus direitos, usando a roupa que quiserem, se comportando da maneira que julgarem adequada e, principalmente, capazes de conquistar o próprio espaço independente de sua aparência. Não me espantarei com as evoluções. Não me espanto com todas que já vemos. Mas ainda me espanto com a selvageria...e por isso ainda precisamos de proteção. Até quando "não mereceremos ser estupradas"?

quarta-feira, 25 de maio de 2016

Menina ou Menino?

Tenho tido dificuldade em escrever neste blog. Aqui devem ser registradas as aprendizagens, as reflexões acerca do nosso curso, as ações concretas que realizamos, os projetos, enfim, registros de coisas interessantes e inerentes ao curso de Pedagogia. Estar em casa, afastada das aulas presenciais e da atividade docente por conta da licença maternidade tem sido um desafio. Neste delicioso e trabalhoso período da vida, escrever sobre tudo isso que mencionei não flui naturalmente como fluía antes do nascimento da filha. Mas, nesta semana, recebi um video que me remeteu a uma situação doméstica e também relfete nas questões que temos nas escolas. 
O  vídeo Inspiring The Future - Redraw The Balance mostra uma mulher em classe propondo que os alunos desenhassem bombeiros, pilotos de avião e cirurgiões, como imaginavam que seriam. Lembrando sempre que no idioma do vídeo as profissões não têm gênero.   Teacher, firefighter, pilot, surgeon serve pra ambos os sexos. Na nossa língua, usamos, muitas vezes a terminação "a" ou "o" nas profissões. Talvez se fosse na língua portuguesa, poderíamos dizer que as crianças foram "influenciadas" pelo gênero que a palavra em si é denominada (sempre masculino). No entanto, a experiência demonstrada no video nos mostra que os estereótipos de gênero já existem nas crianças.
Mas e a questão doméstica que mencionei anteriormente? 
Bem, tenho dois filhos meninos e agora nasceu a menina. Durante a gestação, conversando com os meninos (de 4 e 6 anos) observei que tinham a constante preocupação com os brinquedos que estariam disponíveis no quarto para a irmã. Quando souberam que teríamos uma menina na família a decepção deles foi porque não teriam mais brinquedos "de meninos" adicionado ao seu repertório. A notícia da menina em suas vidas caiu como uma bomba: "então teremos bonecas no nosso quarto?" "Onde colocaremos nossos carrinhos, dinossauros, super heróis e legos se ela vai colocar bonecas?" 
Foi assim que percebi que já tinham estabelecido em suas vivências os estereótipos do que é "de menina" e "de menino". 
Trabalhei com eles muito a questão de que eu (a mamãe, portanto, "uma menina") brincava com eles de carrinhos, dinossauros, legos, jogos, heróis e gostava muito. E que eles, por sua vez, ajudariam a cuidar da irmã para aprender como é cuidar de um filho. Que muitas vezes estão na cozinha nos ajudando nas tarefas da casa (que são vistas como "de meninas"). Fizemos muitas suposições a eles sobre como ela poderia brincar com eles e eles também com os brinquedos dela quando fossem adicionados ao quarto. 
O enxoval da bebê é rosa, confesso. O deles, azul. Não por falta de opção, mas por oportunidade mesmo (as possibilidades de roupas e acessórios nas cores "de cada sexo" são mais vastas e fáceis). Compartilham o mesmo quarto e por um bom tempo assim será. Mas teremos sempre a preocupação de que não se privem ou fixem à ideia de que há coisas pré determinadas para cada sexo. Quero inspirá-los para que tenham em mente de que podem ser/ fazer o que quiserem, independentemente dos estereótipos.
A vivência do vídeo aborda este ponto: mulheres também podem ocupar posições que eram tida somente como "masculinas". Mulheres podem ser o que elas quiserem. Meninas têm a chance de escolher suas atividades, não há limites para tal! Meninos também!!!
Temos o dever de trabalhar isso na escola, nas famílias, na sociedade. Temos o dever e o direito! E mostrar que as capacidades de realizações ou intelecto não estão definidas no sexo dos indivíduos. 
Brinquedos "de meninas"?

Meninas (ou mulheres) só podem limpar, lavar, cozinhar e têm a obrigação e "utilidade" de ser belas? 
Por quê estes brinquedos não apresentam cores variadas, somente as cores que todos chamam "de meninas"? E afinal, quem definiu que estas cores são "de meninas"? 
A discussão é vasta e nossas oportunidades de discussão também!  
 


Enfim, não mudei a decoração do quarto. Há nele, elementos "de meninos" (caracterizo assim em função da discussão) e elementos "de meninas" serão adicionados também. A convivência e interação será livre e buscaremos oportunizar que tenham acesso a brinquedos que não designem para que sexo "servem". 
E que cresçam conscientes de que a vida é para ser vivida da maneira que gostarmos, fazendo o que gostamos, livres dos estereótipos. E que as crianças não mais se espantem com a possibilidade de ver uma  bombeira, uma pilota e uma cirurgiã!
Por hoje é isso, pessoal! Abraços!



domingo, 15 de maio de 2016

Música: Para Que Te Quero?

     Tive, recentemente, a oportunidade de ver Ivan Lins no Auditório Araújo Viana cantando com a Orquestra de Câmara da ULBRA. Um espetáculo de música, personalidade e ideologia. Entre uma música e outra, uma breve conversa com o público e a reflexão do cantor sobre Música: "Temos que manter vivas as orquestras, preservá-las. Assim como lutamos para preservar as florestas, que tenhamos a percepção de preservar quem faz música de qualidade em nosso país. A música salva, dá vida. Onde há música, não há marginalidade" (lembrando aqui suas palavras). 
     Neste Novo Tempo, em que as lutas estão cada vez mais expostas e têm a chance (ainda) de serem lutadas, brigar e fazer acontecer a música na nossa Sociedade é uma utopia que já tem Lei, mas ainda tem pouca prática. O ensino de música nas escolas públicas e privadas do país, para todos os alunos da Educação Básica é, além de instrumento socializador e educacional, também uma importante ferramenta para que possamos entender melhor a vida!
     A partir de 2008, quando a Lei Federal nº 11.769 inclui um parágrafo 6º que torna conteúdo obrigatório, mas não exclusivo, o ensino de música no componente curricular ensino de arte, previsto no § 2º do artigo 26 da LDB de 1996 . A questão a ser enfrentada, a partir desse momento é a da formação de professores especializados para o ensino de Música. Tarefa que levará algum tempo, muito mais que os três anos estabelecidos pela legislação, tendo em vista serem poucos os cursos de licenciatura em Música no Brasil (http://abemeducacaomusical.com.br/artsg2.asp?id=20). 
     Temos tantas batalhas para vencer na Educação: falta de recursos financeiros e humanos, desvalorização da educação e dos profissionais, descrédito na Educação pública, falta de oportunidade de qualificação e atualização dos profissionais atuantes, entre outras. Incluir o Ensino de música como obrigatoriedade, seria, mais uma batalha que teríamos de enfrentar. E, como todas as batalhas anteriores mencionadas, merecedora de todas nossas forças para que sua implementação seja efetiva. A ideia principal dos idealizadores que batalharam por essa proposta, não é a de formar músicos, mas trazer para o mundo da escola, a música. Dar noções básicas, leitura e escrita musical.  Facilitar o aprendizado; Formar cidadãos mais cultos e conscientes, capazes de valorizar e promover a diversidade cultural  brasileira, fortalecendo os laços comunitários. 
Neste Novo Tempo, (repito) quando ainda podemos lutar, uma batalha a mais na nossa formação de Pedagogia e nos cotidianos de nossas escolas.